TRAGÉDIA EM PRESIDENTE GETÚLIO COMPLETA UM MÊS; PREJUÍZOS PASSAM DE R$ 60 MILHÕES
O vaivém de caminhões e máquinas diminuiu em Presidente Getúlio, mas está longe de acabar. Um mês depois da tragédia que arrastou casas e matou 18 pessoas, há muito trabalho por fazer. Quanto mais próximo do final da Rua Getúlio Vargas, a principal do bairro Revólver, o mais atingido pela enxurrada, maiores os sinais da destruição.
Desde o dia 17 de dezembro os esforços para tentar devolver a normalidade ao município não tiveram descanso. Marcelo Travaglia é um dos servidores da prefeitura que de dentro de uma máquina perdeu as contas de quantas barreiras retirou de estradas da região. Nesta semana ele teve a missão de limpar o acesso aos sítios localizados na ponta da Rua Getúlio Vargas, de onde o mar de lama desceu.
Nenhum terreno foi atingido na localidade, mas os deslizamentos destruíram vários pontos da rua. Pouco mais de 10 pessoas tiveram de ser retiradas de helicóptero naquela manhã. Entre elas a esposa, filho e pai de Alexandre da Silva, que também é servidor e auxiliou Travaglia na desobstrução da via. Silva e a família moraram temporariamente na casa da mãe dele, no Centro, até conseguirem retornar.
Ele e outros proprietários passaram o mês fazendo longas caminhadas para alimentar os animais que ficaram para trás. Silva abriu uma picada usando um facão e semanalmente levava nas costas rações para os bichos. Parte do trecho de mais de três quilômetros fazia pedindo carona. O restante, mata a dentro, precisava ser a pé. Com a retirada das barreiras, chegou ao fim o sacrifício quase que diário.
O prefeito Nelson Virtuoso calcula que 90% das limpezas nas ruas foram concluídas, mas os serviços de reconstrução devem durar pelo menos um ano. Foram quase 40 pontes destruídas, 14 mil metros quadrados de pavimentação, tubulações entupidas ou arrancadas pela força da água, espaços como escolas e unidades de saúde tomados pela lama e veículos municipais totalmente danificados. Ao todo, somadas as perdas do poder público e da comunidade, o prejuízo passa de R$ 60 milhões.
grande que das três cidades do Alto Vale castigadas pelo fenômeno no mês passado, apenas Rio do Sul e Ibirama já liberaram o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para os moradores afetados. A prefeitura de Presidente Getúlio ainda tenta, junto à Caixa Econômica Federal, conseguir que todos os habitantes com saldo disponível recebam o dinheiro, já que, de um jeito ou de outro, praticamente todos sofreram de alguma forma.
A quantia será bem-vinda, principalmente àqueles que perderam tudo, um rombo de mais de R$ 6 milhões, resumidos em 80 casas danificadas e 38 completamente destruídas.
Um dos desafios é lidar com a estrutura de uma prefeitura menor, mas que precisa desempenhar papel de gigante. E rápido. A escola que abriga as doações voltará a receber estudantes no próximo mês. As creches inundadas de lodo também. Na Defesa Civil municipal há um funcionário. São os engenheiros da Secretaria de Planejamento que ajudam na avaliação das condições dos terrenos para retorno ou não dos moradores.
A ajuda que veio de outros municípios e até estados já foi suspensa. Nos primeiros 15 dias após a tragédia chegou a haver 200 máquinas, tratores e caçambas pelas ruas. Atualmente 60 funcionários e dez empresas terceirizadas trabalham na limpeza. A ação incansável dessas pessoas e dos moradores já dão resultados perceptíveis aos olhos.
No Centro, os únicos indícios de que houve a tragédia são algumas marcas nas paredes, que denunciam a altura a que a água chegou, pequenos volumes de terra amontoados em alguns cantos e uma poeira baixa, que é combatida com vassouras e caminhões-pipa.
Além disso, há estabelecimentos que mudaram de local. Uma farmácia fechou e concentrou o atendimento em apenas uma loja. Formalmente nenhum negócio foi encerrado até o momento, mas os prejuízos com mercadorias perdidas e danos já são estimados pela Associação Empresarial e Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Presidente Getúlio: quase R$ 30 milhões.
Para minimizar o impacto, o governo do Estado oferece linhas de crédito de R$ 30 mil a R$ 200 mil a juro zero. O Recomeça SC disponibilizará R$ 30 milhões aos empreendedores atingidos pela tragédia nas três cidades do Alto Vale.
Parte das doações feitas no mês passado começou a se tornar um problema em Presidente Getúlio. O excesso de roupas enviadas já está sendo disponibilizado à toda a população e deve ser distribuído à Assistência Social de municípios vizinhos e entidades beneficentes, adianta Virtuoso.
Um mês depois da tragédia, a cidade precisa de móveis, materiais de construção e mão de obra para que famílias como a de Maria e Wiese possam ter um lar digno novamente. A indicação é que interessados em ajudar entrem primeiro em contato com o Centro de Referência de Assistência Social pelo 47 3352-2148.
A união do solo encharcado e chuva torrencial resultou na avalanche de terra que desceu dos vales no final da noite do dia 16 de dezembro e primeiros minutos de 17. Conforme o geólogo da Defesa Civil de Santa Catarina, Vitor Santini Müller, deslizamentos menores alimentaram outros que, somados à condição de umidade e à água, acabaram ganhando uma força incontrolável. Árvores enormes, pedras gigantes e muito barro tomaram conta das ruas.
Na Rua das Missões, local em que encontraram os últimos corpos desaparecidos, o cheiro de lodo deu lugar ao de jasmim plantado em um quintal. Em um dos troncos de árvores ainda caídas e amontoadas perto do ribeirão, pequenas plantas brotaram, resultando em minúsculos pontos verdes no cenário marrom. É como se o universo insistisse em sinalizar que é preciso renascer em meio à dor. Um passo de cada vez. A vida tem que continuar.
Fonte: NSC